Neollogia
Cogitações e quejandas quimeras 🧙‍♂️
.・゜゜・Omnia Mutantur ・゜゜・.

A letra Q

O Q maiúsculo atual é basicamente um círculo com um pequeno apêndice, já o q minúsculo é curiosamente semelhante a um p espelhado e também traz certa semelhança com o g minúsculo.

Koppa

Nossa versão, que vem do alfabeto latino, descende do velho itálico e do grego, a letra Qoppa, que era um círculo com uma linha reta embaixo, como uma coluna. 

Qoph

É uma versão simplificada do Qoph fenício, constituído de um círculo atravessado de cima abaixo por uma linha. Sugere-se que talvez seja a representação de uma agulha com uma linha, uma das tecnologias mais antigas da humanidade. Outra teoria é que seja a representação de um macaco e sua cauda. A palavra hebraica "quf" (קוף), a propósito, significa "macaco".

Qof

No proto-caananita temos o Quf, no hebraico Qof, no aramaico Qop e no árabe Qaf. Nos numerais hebraicos, Qof representa o número 100.

Proto-semitic Q

No proto-semítico, este primitivo Q é formado por duas elipses, lembrando um 8, o que também nos traz à memória o infinito.

Q typographic styles

Tipograficamente, as variações mais comuns do Q maiúsculo envolvem a posição do seu apêndice, que pode atravessar o círculo, sair do círculo sem atravessá-lo, posicionar-se fora do círculo sem ter contato com ele, assumir um formato de número 2 com o círculo ou posicionar-se no interior do círculo.

Em 2017 foi lançada uma linguagem de programação desenvolvida para uso em computação quântica. Ela foi nomeada Q Sharp, representada por Q#.

Assim como tem sua familiaridade com o 8 e o infinito, o Q também pode assemelhar-se a uma espiral, que tem ligação com o número 9, pois a espiral é uma variação do infinito, porém enfatizando a evolução, já que cada círculo torna-se maior que o anterior a cada volta, rumando para o infinito. Espiral é constante transformação.

Assim como o Q tem uma relação ancestral com a agulha, mais precisamente com o olho da agulha e sua linha, representando criatividade, o ato de tecer, interligar, criar, reparar o que foi rasgado, também pode relacionar-se ao próprio olho e este à inteligência, à mente, à consciência. 

E o que é mais infinito senão a consciência? Ela que atravessa dimensões e o tempo, ela que é a única capaz de atestar a própria existência, eternizando-se neste mesmo ato auto criador.

(12,06,2024)

A série Cally's Caves

Cally's Caves 2

Cally's Caves é um jogo indie estilo plataforma 2D com elementos roguelike e metroidvania. Lançado inicialmente em 2015, com o tempo surgiram sequências. A numeração é um pouco confusa, pois no site do desenvolvedor não existe um Cally's Caves 1. A lista começa do segundo, que foi lançado para Android e iOS.

Na Steam foi lançado primeiro o Cally's Caves 3, em 2016, seguido pelo Cally's Trials, que é uma versão para Steam do Cally's 2. Em 2018 saiu o Cally's Caves 4.

Cally's Caves

É um jogo simples, mas que proporciona algumas dezenas de horas de diversão, pois possui uma boa quantidade de cenários e biomas, bem como de monstros e bosses. Possui um diferencial na jogabilidade que é o fato das armas ganharem nível à medida em que são usadas. Isso realmente dá um gosto a mais ao jogo, pois você tem um incentivo para continuar usando as mesmas armas de modo a torná-las mais poderosas. E vale a pena, pois nos últimos níveis elas são bem overpower.

Além do visual fofo e de cenários bons de explorar (nem muito simples nem muito labirínticos), a trilha sonora com estilo eletrônico é bem agradável. O fato da protagonista ser feminina também é um diferencial nesse gênero de jogo.

Cally's Caves

(08,09,2019)

O vasto mundo dos jogos idle e clicker

Nos últimos anos cresceu um novo gênero de videogame chamado idle (ocioso) ou incremental. A ideia é uma jogabilidade ininterrupta em que as pontuações continuam evoluindo mesmo que você não esteja jogando, até mesmo se o jogo estiver fechado, porque ele usa fórmulas matemáticas para calcular o progresso com base no tempo real.

E haja matemática. Uma característica de todos esses jogos aqui listados é o uso de números que crescem exponencialmente de uma forma nunca vista em qualquer outro gênero. Se você começa com personagens causando dano de 1, 5, 10 hits, em apenas uma hora a coisa já chega aos quintilhões, sextilhões e continua evoluindo para potências absurdas.

Cookie Cliker (2013)

Outro elemento comum nesses jogos é o fato de que basicamente o que você tem que fazer é clicar repetidamente na tela, daí tais idle games serem também chamados de clicker (clicador). Essa mania começou em 2013 com o Cookie Cliker, que não cheguei a jogar. Você gerencia uma fábrica de produção de guloseimas e a meta é produzir mais e mais, infinitamente.

Clicker Heroes (2015)

O primeiro clicker que joguei foi o Clicker Heroes (2015), que parece bem mais complexo que o Coockie Clicker, pois tem elementos de RPG. Você vai adquirindo heróis e tornando-os mais poderosos para combater monstros na tela e também pode realizar missões que consistem em enviar personagens e esperar que eles retornem após alguns minutos ou horas ou até dias.

No começo tudo que você tem que fazer é clicar e clicar, mas com o progresso já consegue comprar um clicador automático. De toda forma, é um jogo cujo progresso depende do tempo, como em todo idle game. Você vai levar meses pra cumprir a maioria dos achievements.

Por ser meu primeiro clicker, passei um bom tempo com ele. A verdade é que idle game não é algo que se "joga". No começo a gente fica clicando feito louco, mas depois a coisa consiste em todo dia entrar no jogo pra ver o progresso acumulado, comprar as melhorias e sair.

Clicker Heroes 2 (2018)

Em 2018 lançaram o Clicker Heroes 2. Desta vez a Playsaurus seguiu uma estratégia bem diferente. Os jogos idle costumam ser gratuitos porque apostam no vício. Os viciados e ansiosos vão gastar dinheiro em microtransações, comprando coisas que acelerem o processo de evolução. O Clicker Heroes 2, ao contrário, é pago e deve pegar leve nas microtransações. Também deram um belo upgrade na aparência.

Adventure Capitalist (2015)

Adventure Capitalist (2015), produzido pela Hyper Hippo, é uma divertida paródia do empreendedorismo. Você começa produzindo e vendendo limões, jornais e pizzas e a coisa vai escalonando absurdamente, você vai adquirindo novas empresas até chegar ao ponto de colonizar a Lua e depois Marte. É um Elon Musk simulator. Seguindo a mesma brincadeira, também lançaram Adventure Comunist (2016), que não cheguei a jogar.

RuneScape: Idle Adventures (2016)

A Hiper Hyppo também produziu em 2016 o RuneScape: Idle Adventures, mais uma daquelas tentativas da Jagex de lançar um produto derivado do seu MMORPG Runescape. Foi também o caso do card game Runescape Chronicles, que gostei muito. Ambos os jogos baseados em Runescape, porém, foram descontinuados.

Guild Quest (2017)

Em 2017 a Hiper Hyppo lançou Guild Quest que é um idle bem diferente. Primeiro não é bem um clicker e é mais focado em RPG. Você controla uns exércitos de bonequinhos palito com suas diversas classes (guerreiro, clérigo, explorador, etc.) e os vai enviando em missões em diversas ilhas. As missões rendem experiência, baús de itens e ouro e você pode usar o ouro pra diversas melhorias.

Tudo acontece automaticamente. Os bonequinhos ficam realizando as missões pelo mapa ciclicamente e mesmo quando você sai do jogo o algoritmo irá calcular o tempo transcorrido e entregar os pontos e ouro quando você retornar. Eu experimentei o jogo em 2017 por umas semanas e abandonei. Só agora em 2019 voltei a instalar pra dar uma olhada e eis que eu estava com uma fortuna trilionária que foi acumulada ao longo desses dois anos ausente.

Mas não é fácil evoluir. As melhorias vão exigindo cada vez mais ouro e os mais impacientes podem apressar isso comprando pacotes de bônus na loja ingame. Essa é a pegadinha desses jogos gratuitos: as microtransações que interessam os mais viciados e apressados em progredir no jogo.

Time Clickers (2015)

Time Clickers (2015) tem um visual de mundo digital. Você usa uma pistola para destruir bloquinhos e vai comprando melhorias e evoluindo uma árvore de habilidades pra causar danos absurdamente maiores. A mesma desenvolvedora, Proton Studio, em seguida lançou um sucessor, Time Warpers (2020).

Tap Tap Infinity (2015)

O Tap Tap Infinity (2015) é bem parecido com o Clicker Heroes, mas com um visual mais 3D. Joguei por um tempo, mas perdi todo o progresso porque não salvou automaticamente na nuvem da Steam.

Crush Crush (2016)

Sakura Clicker (2015)

O Crush Crush (2016) tem um visual fofo de anime e, claro, um pouquinho de safadeza nas falas das personagens enquanto você clica nelas, mas não chega perto da safadeza do Sakura Clicker (2015), com garotas em roupas provocantes e gemendo bem naquele estilo ecchi.

Crusaders of the Lost Idols (2015)

Crusaders of the Lost Idols (2015) é um 2D side scrooler, ou seja, os personagens vão percorrendo a tela enquanto enfrentam os inimigos e você vai clicando pra evoluir suas habilidades.

Tap Tap Legions (2016)

Tap Tap Legions (2016) tem uma temática medieval e você comanda umas tropinhas que vão avançando e lutando no cenário.

Idle Wizard (2019)

Idle Wizard (2019) tem uma temática de ocultismo e magia que é legal, mas a  evolução é bem maçante. O visual é meio feinho.

Browseando a Steam, vi vááários outros jogos do gênero, como Insanity Clicker (2016), Shonen Idle Z (2016), Soda Dungeon (2017), Zombidle (2017), Idle Champions of the Forgotten Realms (2017), Loading Screen Simulator (2017), Wild West Saga (2018), God Awe-full Clicker (2018), Wizard and Minion Idle (2019), etc, etc.

A distribuidora Kongregate parece especializada nisso. Tem o Bit Heroes (2017), Office Space: Idle Profits (2017), Kitty Catsanova (2018) e fiquei curioso com o Realm Grinder (2016), porque tem a temática de construção de cidade, uma versão idle de civ game (jogo de civilização).

A distribuidora Autotelic tem uns títulos beeem repetitivos: Castle Clicker (2017), Monster Clicker (2018), Christmas Clicker (2018) e Easter Clicker (2019).

Little Inferno (2012)

Little Inferno (2012) tinha tudo pra ser um idle, mas é apenas um clicker sem automatização. Consiste simplesmente em uma lareira e você vai comprando coisas e queimando, o que gera moedas pra comprar mais coisas. À medida que compra e realiza combos, você desbloqueia novos itens e por aí vai. Seria interessante se fosse possível automatizar o processo. Em meia hora fiquei entediado dessa tarefa repetitiva de comprar e queimar. De toda forma, os piromaníacos devem achar o jogo bem catártico.

Achievement Clicker (2017)

Tem um clicker que é o cúmulo da simplicidade: Achievement Clicker (2017). O objetivo do jogo claramente é te presentear com 5000 achievements que você ganha pelo simples fato de clicar na tela.

A Steam tem desses jogos que podem ser considerados uma categoria própria, os achievement farming. Alguns podem até ser joguinhos divertidos, mas geralmente são bem simples ou toscos, mas você sabe que está ali não pela jogabilidade e sim pra ganhar os pontos de conquista que ficam spamando na tela a cada passo que você dá.

E esse tipo de jogo vende porque a Steam em si é como um jogo. O seu perfil vai evoluindo quando você faz compras, participa de eventos, coleciona cartas e conquistas. Então pra encher o perfil de conquistas, tem gente que gosta de farmar esses achievements e geralmente os jogos que oferecem isso são baratíssimos. Esse Achievement Clicker, por exemplo, estava por 1 Real na promoção. Não resisti e comprei.

A desenvolvedora já lançou o Achievement Clicker 2017, 2018, 2019 e parece que o 2020 também está pra ser lançado, para satisfação dos farmadores. Já eu parei no primeiro mesmo. Pra mim já deu.

Mushroom Cats (2019)

Em 2019 foi lançado na Steam o Mushroom Cats que não é um idle game, mas é puramente clicker. É um jogo curtíssimo, que consiste em apenas um arquivo exe de 20 MB e carrega um único cenário animado em que você deve coletar uns hats e colocar nos gatinhos, farmando um achievement pra cada gato. É um joguinho fofo e que você zera em poucos minutos. E como é gratuito, why not give a try?

E a lista continua: Idle Armada (2020), Idle Slayer (2020), IdleOn (2021), Idle Skilling (2022), Idle Factory (2022), Tap Ninja (2022), Idle Clans (2023), que tem o diferencial de adotar um estilo MMORPG, Galaxy Clicker (2024).

Banana (2024)

E enfim chegamos ao auge do gênero, o jogo da banana. Ele simplesmente se chama Banana (2024) e consiste em uma tela com, adivinhe só, uma banana. Cada vez que você clica, uma numeração vai aumentando e é só isso. Não tem animações, nem mudança de tela. É sempre a mesma tela com a banana e um contador. 

Por um motivo enigmático, este jogo simplório passou dos 900 mil players diários na Steam e parece ter feito uma pequena fortuna com a venda de skins para a banana. Ele tem uma comunidade engajada no Discord e na oficina da Steam, criando diversas skins para a bendita banana.

(17,07,2019; 23,08,2024)

Barbárie versus civilização em A Guerra do Fogo

La Guerre du Feu (1981)

La Guerre du Feu (1981)

Em tempos remotos, o fogo era a maior maravilha a que a humanidade tinha acesso, era a tecnologia mais importante para a sobrevivência, garantindo aquecimento e proteção contra as feras. Em La Guerre du Feu (1981), acompanhamos a saga de humanos primitivos neste perpétuo esforço para literalmente manter a chama acesa.

Os protagonistas pertencem a uma tribo que sequer descobriu como produzir fogo (uma tribo fictícia chamada Ulam). Eles precisam manter uma fogueira acesa a todo tempo, e quando vão migrar para outra região precisam levar a chama em uma espécie de lampião feito de galhos e ossos. Quando por descuido ou acidente a chama se apaga, lá vão eles numa saga em busca de alguma fogueira de outra tribo a fim de roubar o fogo.

Assim, diversas tribos estão constantemente entrando em conflito, uma tentando roubar o fogo da outra. É a guerra do fogo.

É uma vida cheia de riscos constantes. Além do esforço para manter a chama e lidar com invasores, também há os perigos ambientais, o clima e as feras. A vida dos homens das cavernas não era mole não e raramente alguém chegava à velhice.

Rae Dawn Chong and Nicholas Kadi in La Guerre du Feu (1981)

O destino dos homens Ulam começa a mudar quando eles conhecem uma garota da tribo Ivaka. Ela se diferencia deles e dos demais bárbaros, pois não se veste com farrapos de pele de animais, mas anda praticamente nua, porém coberta com uma tintura que deve oferecer algum grau de proteção à pele. 

Ela também parece ter uma linguagem mais elaborada. Se expressa com muitas palavras, diferente dos homens brutos que, embora pronunciem algumas palavras primitivas, costumam se comunicar por grunhidos e sons simiescos.

Eles conhecem a aldeia da garota, e vemos como aquela tribo é mais evoluída. Em vez de viver nas cavernas, construíram cabanas, possuem diversos objetos confeccionados, ferramentas rústicas, cabaças de água, máscaras ornamentais, mas o que é mais fascinante é que eles conseguem produzir fogo.


O momento mágico do filme acontece quando o bruto da tribo Ulam observa estupefato um Ivaka manipulando uma broca, uma ferramenta primitiva que, por meio de constante fricção sobre madeira e palha, produz uma faísca e a partir dela o fogo. Com suas próprias mãos, um humano dá vida a esta entidade anímica e que até então parecia incontrolável.

Aí se nota o abismo tecnológico que havia entre os Ulam e os Ivaka. Enquanto aqueles passavam a vida lutando em busca do fogo, o seu bem mais raro e precioso, os Ivaka tratavam o fogo como algo trivial, já que facilmente podiam acender uma fogueira com as próprias mãos.

A história se passa há cerca de 80 mil anos e não pretende ser arqueologicamente acurada, pois no fim das contas é um conto fictício e não um documentário. De toda forma, é uma dramatização formidável dos tempos primitivos da espécie humana e que se tornou um merecido clássico do cinema.

A performance dos atores é um espetáculo à parte, já que o filme não tem diálogos na forma convencional. Eles se comunicam com linguagem corporal, grunhidos e, quando muito, com palavras estranhas. De fato, uma língua primitiva fictícia foi desenvolvida pelo novelista e linguista Anthony Burgess para uso dos personagens. Lembrando que Burgess também criou as gírias da linguagem Nadsat do filme Laranja Mecânica (1972).

Atlatl

O abismo tecnológico entre as tribos pode ser notado nos mínimos detalhes. Enquanto os Ulam só usavam paus como armas, os Ivaka já haviam desenvolvido uma espécie de precursor do arco, uma arma que hoje conhecemos como atlatl e consistia em uma base de madeira sobre a qual era colocada uma pequena lança e esta base oferecia precisão e propulsão ao arremesso da seta.

Outro curioso exemplo da diferença entre as tribos é que os Ulam faziam sexo como bestas, com o macho agarrando a fêmea por trás e rapidamente concluindo o coito. Ao longo da história vemos o desenvolvimento de uma espécie de romance entre a garota Ivaka e um dos Ulam. Eis que em certa ocasião eles iniciam o coito, mas a garota faz algo inusitado. Ela se vira de frente para ele, assumindo a posição que hoje conhecemos como "missionária" ou "papai-mamãe".

É interessante como esta simples mudança de posição mostra que aqueles humanos estavam avançando para outro estágio, diferenciando-se dos animais. Até mesmo na prática sexual, desenvolve-se uma diferença entre a barbárie e a civilização.

O contraste entre os Ulam e os Ivaka marca a diferença entre barbárie e civilização. Pode-se dizer que a civilização nasceu ali, no domínio do fogo, quando enfim os humanos superaram a limitação animal, pois existem animais capazes de manipular objetos como ferramentas e construir casas, mas somente os humanos dominaram o fogo e desde então avançaram numa jornada tecnológica e científica de conhecimento e domínio dos elementos da natureza.

Obviamente a civilização não é apenas um fenômeno tecnológico ou científico, mas também cultural, de comportamento, de valores e até mesmo de predileção ao pacifismo. As tribos mais bárbaras optavam pela violência ao primeiro contato, cobiçavam e roubavam o que era dos outros. Isto porque viviam num constante estado de escassez e a escassez de recursos básicos alimenta a barbárie.

A tribo Ivaka desfrutava de abundância proporcionada pelos seus avanços tecnológicos, pois tinham armas de caça melhores, tinham o fogo sem necessidade de roubá-lo de outras tribos, então já não eram predispostos a buscar sempre o conflito. 

É certo todavia que a civilização não deve adotar o pacifismo no sentido de tornar-se frágil e indefesa. O pacifismo da civilização é o mesmo dos búfalos e hipopótamos. São pacatos até o momento em que precisam se defender. Os Ivaka tinham armas melhores e com o atlatl podiam facilmente derrubar qualquer bárbaro que se aproximasse com um porrete.

A paz na civilização é a paz pela força e pela ordem, o que, ironicamente, pode levá-la de volta à barbárie caso esta ordem se torne tirânica. A luta da civilização contra a barbárie é eterna. É uma luta defensiva, protegendo-se da invasão dos bárbaros, e é uma luta preventiva, evitando que ela própria se corrompa e retorne à barbárie.

Quest for Fire (1981)

(22,08,2024)

Palavras-chave:

Anthony Burgess, Jean-Jacques Annaud, Nicholas Kadi, Rae Dawn Chong, Ron Perlman

11 Bit, um de meus studios de games favoritos

11 Bit Studios

Sou fã da 11 Bit Studios desde quando joguei This War of Mine (2014) em 2017. Em 2020 conheci Frostpunk (2018) e ao longo do anos revisitei ambos os jogos vez ou outra. Dá pra notar que o studio polonês mantém uma certa identidade em seus títulos, uma ambientação melancólica, com cores frias, uma temática apocalíptica e a jogabilidade voltada à sobrevivência.

A 11 Bit também distribui títulos de outras desenvolvedoras, e estes títulos têm a sua própria identidade, mas os que mais me atraíram foram os títulos feitos pelo próprio studio, justamente por causa dessa assinatura que adotaram.

The Invincible (2024)

Entre os títulos distribuídos, eu joguei Moonlighter (2018), que é um RPG indie bem gostosinho, e cheguei a experimentar The Invincible (2023) por cerca de uma hora, mas desisti de jogar por causa de motion sickness. O visual é bem agradável e a temática de exploração em um planeta me lembrou Lifeless Planet (2014), um jogo indie de cuja história gostei bastante. O problema é a movimentação da câmera, principalmente quando o personagem escala no cenário, aí me dava logo um cansaço na vista. 

Indika (2024)

Também tem Indika (2024) e The Thaumaturge (2024) que, embora não sejam da 11 Bit, parecem ter um estilo sombrio e melancólico que combina com a identidade do studio. Até o momento só observei algumas gameplays destes dois, mas não cheguei a jogar.

Quanto aos títulos desenvolvidos diretamente pela 11 Bit, eles começaram com um joguinho bem genérico de tower defense: Anomaly (2013) e Anomaly 2 (2013). Parece ser a fase experimental e ainda a infância do studio, mas não posso opinar sobre a qualidade do jogo, já que apenas vi alguma gameplay e nunca joguei.

This War of Mine (2014)

De toda forma, acho que é em This War of Mine que o studio estabelece seu DNA, mas o seu grande título é Frostpunk, um sucesso que já lançou várias DLCs e está para lançar o Frostpunk 2 agora em 2024. Além disto, também este ano lançarão The Alters, que logo de cara identifiquei por se assemelhar a um joguinho bem legal que conheci há uns anos, The Swapper (2013). The Alters será certamente uma versão melhorada do The Swapper. Para mim é um jogo que nem joguei ainda e já sei que vou gostar. 

É um studio novo, que vem crescendo rapidamente, mas mantém uma alma indie no sentido de prezar por uma identidade em seus títulos. This War of Mine é um jogo realmente especial, sensível, imersivo, nos colocando dentro de um mundo em guerra, tendo que nos preocupar com as coisas mais triviais como água e comida. 

A inteligência artificial dos personagens funciona de uma forma muito convincente, de modo que a gente tenta tratá-los como se fossem humanos com os quais a gente se importa. Se você expor demais um personagem a stress e situações violentas, até mesmo se resolver sair matando tudo e todos nas ruas, ele pode ficar deprimido e até dar um fim à própria vida. É um jogo cativante e também vale mencionar a melancólica trilha sonora.

Frostpunk (2018)

Frostpunk, por sua vez, é o mais importante título do studio. Tem uma proposta bem diferenciada de ser um jogo de civilização ambientado em uma espécie de era do gelo, com toda a cidade existindo em torno de um enorme gerador de calor, o coração que mantém todos vivos. A história que ambienta este jogo poderia muito bem render um livro de sci-fi ou mesmo uma série ou filme.

A história se passa em 1886, numa realidade alternativa onde a massiva erupção do Krakatoa (ocorrida em 1883) cobriu o planeta com densas nuvens, causando um inverno vulcânico em nível global. O Império Britânico e os Estados Unidos projetaram enormes geradores que foram levados por veículos para regiões ricas em carvão, estabelecendo cidades em torno de cada gerador.

Afinal estamos lidando com uma época em que não existia energia atômica e o carvão ainda era a fonte mais viável de aquecimento. Desta forma, Frostpunk já é parte da galeria dos raros e interessantes jogos steampunk.

(08,08,2024)

Palavras-chave:

11 Bit Studios

Hollywood contempla seu passado de caos e glória em Babylon

Bad Pitt in Babylon (2022)

Margot Robbie in Babylon (2022)

Hollywood adora a metalinguagem tautista, voltada para si mesma. Nada errado nisso. É interessante quando a indústria do cinema se olha no espelho, como uma espécie de manifestação anímica de consciência. 

Vez ou outra temos filmes assim, que tratam do próprio mundo do cinema, como La La Land (2016), que mostra uma aspirante a atriz encantando-se e ascendendo na carreira neste mundo de fantasia que é o cinema. Outro exemplo é Birdman (2014), que aborda outro aspecto, o lado mais decadente dessa indústria, quando um ator famosíssimo tem de lidar com a deterioração da fama, depois que seus dias de glória do cinema acabaram.

Voltando ainda mais no tempo, temos um dos maiores exemplos do tautismo metalinguístico de Hollywood: Singin' in the Rain (1952), que conta a história de uma grande estrela do cinema experimentando a transição do cinema de mudo para falado e desta forma nasce o musical.

Babylon (2022) segue esta mesma linha, voltando no tempo para os primórdios do cinema, mostrando o período de transição do cinema mudo e explorando de forma bastante cômica a rotina das gravações, o caos, os improvisos, as dificuldades técnicas em fazer uma simples cena com áudio, pois o menor ruído no studio poderia estragar tudo. Bom lembrar que o filme é do mesmo autor de La La Land, Damien Chazelle.

Também vemos outro lado deste mundo de glamour: as festas, orgias; a protagonista Nellie (Margot Robbie) era uma garota pobre que rapidamente ascendeu na carreira, mas era inconsequente, aventureira, arranjando problemas sérios com drogas, dívidas e agiotas. Hollywood não esconde o seu lado dionisíaco, literalmente praticando bacanais, entregando-se a vícios e perversões.

Babylon é um filme modesto, mas faz sua homenagem à era de ouro do cinema e também no finalzinho mostra um vislumbre do que o cinema se tornaria, avançando de sua fase artesanal para a era industrial, para a evolução dos efeitos especiais, chegando a grandes espetáculos de fantasia como o filme Avatar (2009), até hoje a maior bilheteria da história.

De certa forma, neste filme o cinema reflete sobre a sua própria constante metamorfose. Sempre haverá transições e nem todos os artistas vão se adaptar. O protagonista Jack Conrad (Brad Pitt), por exemplo, foi uma grande estrela do cinema mudo, atuando em dezenas de filmes, mas não conseguiu se dar bem com o cinema falado, até chegar ao ponto de simplesmente desistir.

E as mudanças vão continuar. De mudo para falado, de preto e branco para colorido, de analógico para digital... Muito provavelmente um dia chegaremos ao ponto em que os filmes nem mesmo precisarão de atores humanos, pois os personagens serão totalmente digitalizados e controlados por IA. O cinema, porém, vai continuar existindo.

Babylon (2022)

(07,08,2024)

Palavras-chave:

Brad Pitt, Damien Chazelle, Margot Robbie, Paramount

Guerra sem Regras, um divertido filme baseado na Operação Postmaster

The Ministry of Ungentlemanly Warfare (2024)

The Ministry of Ungentlemanly Warfare (2024)

No auge da Segunda Guerra, a SOE (Special Operations Executive), também conhecida como "O Exército Secreto de Churchill", organizou uma operação secreta (Operation Postmaster) na ilha espanhola de Fernando Po. Distraindo os oficiais alemães com uma festa, os agentes da SOE invadiram dois navios rebocadores e simplesmente levaram o navio mercante italiano Duchessa d'Aosta, debaixo do nariz dos alemães.

O navio estava carregado com uma fortuna de suprimentos variados, o que causou um grande prejuízo para o Eixo, além disso, como ele tinha um equipamento de rádio, a captura prejudicou a comunicação do Eixo na região e de bônus os espiões ainda tiveram acesso a documentos no navio com informações valiosas. 

Além disso, a operação foi tão ousada, um verdadeiro heist movie da vida real, que aumentou a moral do SOE, mostrando do que o governo britânico, liderado pelo gênio de Churchill, era capaz.

É baseado neste evento que temos o livro Churchill's Secret Warriors: The Explosive True Story of the Special Forces Desperadoes of WWII (2014), escrito por Damien Lewis. Dez anos depois, veio a adaptação cinematográfica The Ministry of Ungentlemanly Warfare (2024), dirigido por Guy Ritchie. 

O filme não se leva a sério. Tem uma vibe Bastardos Inglórios, só que mais zoeiro. Mesmo baseado em uma história real da Segunda Guerra, adota um tom cômico e exagera nas cenas de ação. Um dos espiões, o Anders Lassen (interpretado pelo armário ambulante do Alan Ritchson) simplesmente sai matando os oficiais nazistas com um arco e flecha, nunca errando um tiro. 

Henry Cavill in The Ministry of Ungentlemanly Warfare (2024)

Alan Ritchson in The Ministry of Ungentlemanly Warfare (2024)

O Henry Cavill interpreta o agente Gus March-Phillipps, liderando o grupo com um carisma peculiar. Não é a primeira vez que ele atua em filme de espionagem, pois antes já protagonizou o The Man from U.N.C.L.E (2015) e também deu as caras no Mission: Impossible - Fallout (2018), inclusive performando uma cena que ficou memorável, quando ele faz um gesto de carregar os braços antes de se engajar numa luta.

Churchill é interpretado por Rory Kinnear com uma forte presença, fazendo uma digna homenagem a essa figura lendária da história do século XX. Também temos uma breve aparição de Ian Fleming, ninguém menos que o criador de James Bond e que na vida real de fato trabalhou no serviço de inteligência britânico.

The Ministry of Ungentlemanly Warfare (2024)

(06,08,2024)

Palavras-chave:

Alan Ritchson, Amazon, Churchill, Damien Lewis, Elza González, Guy Rithcie, Henry Cavill, Ian Fleming, Lionsgate, Rory Kinnear