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A transição do DCEU para o DCU

Aqui coleto uma série de posts que escrevi entre 2022 e 2024 quando estava acontecendo a transição do DCEU para o DCU. Tudo começou com a chegada do David Zaslav e o cancelamento da Batgirl. Aproveitando o vácuo deixado pelo Zack Snyder, o The Rock tentou engatar uma continuação do universo com base no Black Adam, mas então chegou o James Gunn para enfim anunciar o novo DCU. Veio a fase de transição, simbolicamente representada pelo The Flash, e o réquiem do antigo DCEU. 

(10,09,2025)

O fim da Batgirl e o início de um novo DCU

Batgirl

Na quase centenária competição (com eventuais momentos de cooperação) entre Marvel e DC, a liderança esteve sempre alternando. Ora a Marvel estava no topo, ora a DC. Nos anos 90, a Marvel chegou até a declarar falência, vendeu os direitos de exibição de vários personagens e acabou dando a volta por cima porque entrou definitivamente no mainstream do entretenimento cinematográfico com os sucessos do Homem-Aranha e X-Men na primeira década dos anos 2000, e com o ainda mais estrondoso sucesso dos Vingadores na segunda década.

Hoje os quadrinhos não são mais o principal negócio da Marvel e da DC. Quadrinhos são a fonte de inspiração, mas os holofotes estão voltados para o audiovisual, para os filmes e séries que se tornaram a mina de ouro destas clássicas editoras (que hoje nem mesmo são editoras per se, mas subsidiárias de dois gigantes da mídia, Disney e Warner).

No audiovisual, a Marvel está liderando a disputa há um bom tempo. A DC no cinema nas últimas 4 décadas basicamente fez sucesso apenas com seus dois principais personagens: Batman e Superman. A Marvel, por sua vez, além de fazer sucesso com Homem-Aranha, X-Men e Vingadores, que são bastante conhecidos no mundo, também conseguiu se dar bem com personagens até então bem desconhecidos, como os Guardiões da Galáxia. A quantidade de filmes que a Marvel fez em muito supera a DC, bem como o lucro que teve com todos eles.

Em 2012 a Marvel concluiu sua primeira fase do MCU, com o filme dos Vingadores, o que foi um marco não só pelo sucesso e pela fortuna que arrecadou, mas também pelo incomum modelo de universo cinematográfico. Cada filme solo de um personagem se relacionava com outro, dava pistas nas cenas pós-crédito, era um quebra-cabeças compondo o quadro de uma trama que envolvia filmes, curtas, animações e séries, culminando em crossovers que amarravam tudo. Foi um brilhante planejamento narrativo.

Vendo isto, a DC obviamente entendeu que precisava se apressar para alcançar seu concorrente que corria a largas passadas. A partir de Man of Steel, em 2013, a DC prometia desenvolver seu próprio universo cinematográfico interligado, o DCU. Na prática, porém, nunca conseguiu fazer algo com o nível de organização, coerência e planejamento da Marvel. Nestes últimos dez anos, o DCU foi uma bagunça.

Em parte o motivo foi a falta de uma figura centralizadora, um líder e planejador. A Marvel teve o seu Kevin Feige. A DC não teve uma pessoa diretamente responsável pelo DCU, mas a princípio parecia que o Zack Snyder seria esse cara. O máximo que ele conseguiu foi desenvolver um microuniverso dentro do DCU, o chamado snyderverso. E este ainda foi sabotado por intervenções, como o Joss Whedon, que mexeu no filme da Liga da Justiça, podando o trabalho de Snyder. Depois, a versão full Snyder, o Snyder Cut, foi lançada, mostrando que realmente a intervenção de Whedon só estragou o filme.

Existe outra figura importante, que trabalhou mais nos bastidores do DCU, o Geoff Johns. Ele já foi presidente da DC e é alguém que realmente entende do universo dos quadrinhos. Em vários dos filmes do DCU, de Batman v Superman até Shazam e Black Adam, ele esteve presente ou como roteirista ou como produtor. Também esteve e está envolvido em várias séries do arrowverso, Titans, Doom Patrol, Stargirl, Superman & Lois, etc.

Geoff Johns deu para o DCU uma contribuição muito maior que Zack Snyder. Também foi um responsável direto por boa parte do conteúdo do DCU, trabalhando como roteirista, diferente do Kevin Feige que não escreveu nada para o MCU. O sucesso do MCU, porém, mostra que o papel do produtor é realmente poderoso, pois Feige, como produtor, conseguiu construir um MCU formidável.

É, portanto, isto que falta à DC: um executivo. A Warner/DC tem todos os demais ingredientes para a fórmula de um bom universo cinematográfico. Em termos de cinema, a Warner sempre teve os melhores contratos com grandes atores, diretores, escritores, etc. O que faltava mesmo era ter um Kevin Feige pra chamar de seu, um executivo com senso de planejamento. Talvez agora esta lacuna seja preenchida.

Este ano a WarnerMedia teve uma fusão com o grupo Discovery, uma fusão de gigantes que agora formou a Warner Bros. Discovery. Com isto, uma restruturação teve início. Ann Sarnoff deixou o cargo de chefe dos estúdios da Warner, bem como Andy Forssell, ex-chefe da HBO Max, e Jason Kilar, ex-CEO da WarnerMedia.

Quem assumiu a liderança do novo gigante do entretenimento que resultou da fusão, foi o CEO da Discovery, David Zaslav. Zaslav liderou a Discovery desde 2006 e com bastante eficiência. Ao longo dos anos, a Discovery só cresceu e comprou várias outras empresas de mídia, até ficar tão rica que pôde fazer este negócio colossal da fusão com a Warner.

Neste mundo das comunicações há sempre um peixe maior. A antiga Time Warner foi comprada em 2018 pela AT&T por nada menos que 85 bilhões de dólares, criando a WarnerMedia. Agora a AT&T vendeu a WarnerMedia para a Discovery por 43 bilhões, sendo que os acionistas da AT&T continuarão com 71% das ações desta nova empresa formada pela fusão, enquanto os acionistas da Discovery ficarão com 29%.

Ou seja, do ponto de vista de finanças, a nova Warner Bros. Discovery tem muito mais o DNA dos antigos donos, mas do ponto de vista de gerência, ela terá mais a cara da Discovery, já que a liderança passa para as mãos de Zaslav. É aí que entra a questão do DCU.

Zaslav já chegou chutando a porta, chegou como um juggernaut, um rolo compressor. Ele está aplicando o princípio básico que todo gestor entende que é necessário ao assumir uma empresa: antes de tudo, fazer uma limpeza, podar os galhos ruins, identificar os vazamentos, as rachaduras nas finanças, arrumar a casa.

Zaslav identificou que a HBO Max estava tentando produzir muito conteúdo pra concorrer nos disputado mercado de streaming, mas que resultava em material de baixa qualidade e também baixa audiência. A visão dele é fazer justamente o contrário, focar em grandes produções, pois o resultado em termos de audiência e retenção de clientes é bem melhor do que simplesmente encher o catálogo com filmecos.

Já de cara, ele mandou encerrar a produção do filme da Batgirl (que já estava praticamente pronto e custou uns 90 milhões) e a animação Scoob! Holiday Haunt? Pela primeira vez em décadas, não haverá um filme da franquia Scooby-Doo no final de ano.

Por um lado, parece dinheiro jogado no lixo, mas acontece que, mesmo depois de pronto, um filme continua gastando dinheiro com a publicidade e tudo o que envolve a chamada pós-produção. Zaslav simplesmente resolveu fechar esta torneira. 

É até compreensível que tenha encerrado a Batgirl, pois convenhamos que seria um filme B da DC. Batgirl não é uma Wonder Woman. Ela provavelmente atrairia uma audiência mais nichada. Já o caso do Scooby-Doo é mais difícil de entender, uma vez que se trata de uma franquia bem estabelecida, com uma tradição de filmes natalinos. 

Por mais bizarra que pareça a estratégia do novo CEO, ela curiosamente animou o mercado, pois as ações da Warner Bros. Discovery tiveram alta de 3,5% na Nasdaq um dia depois do anúncio dos cancelamentos. Isto mostra que os acionistas confiam em Zaslav e veem em sua jogada um sinal de que ele está começando a tomar atitudes dentro da nova empresa.

A medida, que alguns fãs podem considerar cruel e insensível, é obviamente parte de um planejamento, o primeiro passo de mudanças que Zaslav pretende realizar nos rumos da empresa, mas também pode ser encarada como um gesto simbólico, um recado. Ele está dizendo: a partir de agora, ou faz direito, ou não faz. Olhando desta forma, é uma notícia promissora para o DCU, a longo prazo.

Se a HBO Max adotar este princípio de qualidade em vez de quantidade, se tornará um serviço de streaming bem mais forte e atraente. A Netflix já está dando o exemplo do que acontece quando se troca qualidade por quantidade. A cada dia a empresa perde assinantes. Netflix já foi sinônimo de séries originais de qualidade, agora ela produz uns filmes genéricos pra preencher o catálogo, filmes que vão aparecer na página inicial por uma semana e depois cair no esquecimento.

Com Zaslav, a DC vai poder focar em fazer filmões, filmaços, vai focar nos personagens que realmente merecem atenção primeiro, ou seja, a galera da Liga da Justiça, especialmente a trindade. Personagens menos conhecidos podem ter seu espaço em séries.

Não é estranho que em dez anos de DCU o Superman tenha apenas um filme solo? O Batman do Ben Affleck sequer teve filme solo e já foi direto pra um crossover com o Superman. Wonder Woman e Aquaman só tiveram dois filmes e o filme do Flash até agora não saiu. Se a DC tivesse seguido os passos da Marvel, em dez anos tranquilamente cada um destes heróis da Liga já teria uma trilogia.

Confesso que eu não apenas espero que o DCU a partir daqui fique focado em grandes produções e priorizando os personagens que devem ser priorizados, mas também que experimente um verdadeiro reboot. Por mim o DCU pode começar do zero, com um novo cast para o Batman, o Superman, até a Mulher Maravilha. O Flash já tem recast garantido mesmo, pois o Ezra Miller já queimou o filme.

Ok, a imagem da Gal Gadot e do Henry Cavill ficou bem marcada, mas convenhamos que um dia o recast tem que acontecer. Ora, já nos acostumamos a ver o Homem-Aranha mudar de ator três vezes, o Batman, então, nem se fala. 

O DCU precisa de um reboot para se reorganizar e desenvolver um projeto para os próximos dez anos. Agora parece o momento ideal, já que a empresa está se reestruturando e até coincide com o fim da era arrowverso, o que significa que um novo universo de séries deve vir nos próximos anos. Se tem alguém que teria coragem de tomar esta atitude radical, é o David Zaslav.

(03,08,2022)

Habemus Black Adam

Black Adam (2022)

A DC está deixando a gente sonhar. Saiu um novo trailer de Black Adam e ele promete entregar o que se espera de um bom filme de super-heróis: um bom CGI, muita ação e fan service.

É isso. Essa é a fórmula. Não precisa de mais nada. Até existe espaço para um toque autoral do diretor, como acontece nos filmes do Zack Snyder, James Gunn, Taika Waititi (errr este aí exagerou no toque autoral e acabou estragando o Thor), mas um bom filme do gênero só precisa fazer o arroz com feijão para oferecer entretenimento de qualidade.

À primeira vista, Black Adam parece disposto a entregar isto, o bom e velho básico. O CGI está bonito, há muita ação acontecendo, o The Rock é um legítimo brucutu de ação e teremos a Sociedade da Justiça na tela.

Além do próprio Black Adam, um personagem que chamou bastante atenção foi o Doctor Fate, encarnado pelo Pierce Brosnan, o eterno 007. Olha, o véio soube envelhecer. Com seus 69 anos, ele é a definição de "coroa enxuto". O visual do Doctor Fate com uniforme e capacete está fidelíssimo aos quadrinhos e eu diria até que ele tem potencial para um ou mais filmes solo como spin-off.

O The Rock já expressou o desejo de ver este filme se ramificar em spin-offs, como um verdadeiro therockverso. Seu mote durante a divulgação do longa é: "A hierarquia de poder do DCEU está prestes a mudar". 

É uma frase enigmática. Coincidentemente, a hierarquia da DC realmente está mudando com a chegada do David Zaslav, mas a intenção do The Rock parece ter sido outra. Talvez ele queira dizer que Adão Negro será o personagem mais poderoso do DCU, mais até que o Superman. Talvez ele esteja até se referindo à construção de um novo universo a partir deste filme e seus spin-offs. Talvez seja só uma frase de efeito.

Enfim, o The Rock é conhecido por seu carisma e ele atrai público, um público que vai ao cinema esperando o puro entretenimento com ação e uma dose moderada de humor. O sucesso estrondoso de Top Gun 2 mostra que o público está faminto por este tipo de conteúdo. Por isso, não duvido que Black Adam faça um bilhão e, se fizer, este filme realmente será o ponto de partida para o novo DCU.

(08,09,2022)

Black Adam e o abismo entre a crítica e o público

Black Adam on Rotten Tomatoes

Até o momento, o filme Adão Negro está com uma curiosa classificação no Rotten Tomatoes: 39% de aprovação da crítica e 90% de aprovação do público. Este é, portanto, um bom exemplo do abismo que pode existir entre os verdadeiros consumidores do cinema (o público, o povão, as pessoas comuns) e os chamados críticos cinéfilos.

Cinema é arte, é a Sétima Arte, mas também é entretenimento. Existe espaço nesta arte para todo tipo de intenções, para mensagens ideológicas, políticas, religiosas, para filmes cabeça, profundos, complexos, mas também para o raso e superficial, para algo feito visando pura e simplesmente a diversão e oferecer um bom momento àquelas pessoas que foram para a sala de cinema esperando por isto.

É ótimo que existam filmes cabeça, mas eles só conseguem existir porque há uma robusta indústria que é fundamentalmente bancada pelos filmes de puro entretenimento. O cinema casual é o alicerce financeiro desta arte. Graças a ele podem existir diretores, atores, roteiristas, artistas digitais e todo um mundo de profissionais que têm seu ganha-pão neste negócio.

Já os filmes mais seletivos, mais cult, e que são os que costumam agradar à crítica especializada, eu compararia a um belo vaso grego decorando a casa.

No movimento artístico do parnasianismo, no século XIX, havia esta ênfase em produzir uma arte pela arte, sem se importar em ser popular, em agradar as massas. O importante era a profundidade da forma ou do conteúdo. Daí o poema O Vaso Grego, de Alberto de Oliveira.

Este poema chegou a ser alvo de chacota dos poetas modernistas, devido a seu alheamento do mundo real. O poeta fixou os olhos em um antigo vaso grego e se pôs a descrevê-lo. Do ponto de vista artístico, porém, este soneto pode ser considerado uma pérola, devido ao capricho no uso das palavras (na verdade, nem é o melhor exemplar parnasiano, pois tem muitas rimas pobres de verbos com verbos).

A questão é que o chamado cinema-arte pode muitas vezes se assemelhar ao Vaso Grego dos parnasianos, por prezar muito pela forma e ignorar um simples fato sobre o grande público: eles querem se divertir. Os cinéfilos querem admirar o vaso e o capricho da obra e não se importam com a diversão.

O próprio Dwayne Johnson, o The Rock, que encarnou o protagonista, resumiu esta questão: "a única coisa que importa para mim é mandar as pessoas para casa felizes". É sobre isto. O grande negócio do cinema é o entretenimento pelo escapismo, gostem os críticos ou não.

The Rock tem uma longa experiência com entretenimento de massas. Começou como jogador de futebol americano, fez sucesso como lutador de wrestling no WWF. O WWF é um big deal nos EUA, é um show de luta pro povão, é audiência garantida. The Rock sempre soube o que fazer para entreter o público.

A iniciação dele no cinema foi mal sucedida, uma vez que ele começou como o Escorpião Rei, no filme O Retorno da Múmia (2011) e depois em O Escorpião Rei (2002) e teve seu papel prejudicado pelo tosco CGI do personagem.

No filme Doom: A Porta do Inferno (2005), adaptação do clássico video game, ele ganhou a Framboesa de Ouro como pior ator. Mas ele, como bom lutador, não desistiu e seguiu ano após ano fazendo uns filmes baratos e marcando sua presença no gênero de ação brucutu.

O fato é que o cara tem um carisma, além de presença naturalmente marcante devido a seu tamanho gigantesco e a forma física trabalhada em uma vida de disciplinada rotina de treinos. Antes de ser um ídolo dos cinemas, é um ídolo da galera da maromba, um exemplo.

Como pessoa pública, ele se mostra sempre atencioso com qualquer um que o aborde, ele não é "fresco", não evita o público, ao contrário, faz questão de interagir e ouvir feedbacks. Ele não é um ator feito para ganhar Oscar e as pessoas sabem que não devem esperar dele um primor de atuação, mas também não é necessário, pois ele está na tela para momentos de descontração.

Ele entrou na franquia Velozes e Furiosos a partir do quinto filme, reaparecendo no sexto, sétimo, oitavo e até em um spin-off, Hobbs & Shaw (2019). Outra franquia em que se estabeleceu foi o remake de Jumanji, que teve dois filmes em 2017 e 2019 e um terceiro está em produção. Também enveredou pela comédia, como Baywatch (2017).

Ele entrou no universo da DC a partir do filme do Shazam! (2019), como produtor executivo, e também está produzindo a continuação Shazam! Fury of the Gods. Aproveitando o embalo, abraçou o projeto do filme do Adão Negro, tanto como produtor, quanto como ator principal. Foi uma escolha muito acertada.

Agora Adão Negro, pela resposta do público, parece ser o filme mais The Rock que o The Rock já fez, ou seja, um cinema de puro entretenimento, voltado para divertir as pessoas sem se importar com a crítica dos cinéfilos. 

Ele caiu muito bem no personagem e Adão Negro promete ser para o The Rock o que Iron Man foi para o Downey Jr., um personagem de blockbuster que rendeu uma década de filmes e a construção de todo um universo compartilhado.

Esperava-se que o filme do Flash fosse o recomeço do DCU, mas pelo visto este recomeço está sendo o Black Adam. Um "therockverso" está a caminho e, como ele costuma dizer: "A hierarquia de poder no DCEU está prestes a mudar". A promessa é simples: uma safra de filmes visando entreter o público e não agradar os críticos.

(26,10,2022)

Habemus James Gunn

James Gunn

O MCU foi um fenômeno cinematográfico formidável na história do cinema e da cultura pop. Foi construído um universo compartilhado de filmes que se estendeu por toda uma década, desenvolvendo uma grande saga elaborada como um quebra-cabeças em vários filmes solo dos personagens e culminando em crossovers, sendo o mais épico deles a duologia Guerra Infinita (2018) e Ultimato (2019).

Enquanto isto, a DC comia poeira ao longo destes dez anos, tentando estabelecer seu próprio universo compartilhado, mas falhando por vários motivos. Um dos motivos foi a falta de uma figura central, um líder e maestro que garantia o planejamento conjunto dos filmes. Na Marvel, este maestro foi o Kevin Feige.

Kevin Feige está envolvido com a Marvel há muito tempo. É o trabalho de sua vida. Já em 1998 ele era produtor associado no filme do Blade, depois foi produtor executivo e co-produtor nos filmes do Homem-Aranha e dos X-Men lá pelos anos 2000. Em 2007 ele se tornou presidente da Marvel Studios, ganhando mais controle sobre toda a produção cinematográfica da franquia. Em 2008 produziu o primeiro Homem de Ferro e o resto é história.

Enquanto isto, a DC não conseguia encontrar seu Kevin Feige. O mais próximo disso foi o Zack Snyder, que, tendo assumido os longas de nada menos que Superman, Batman e da Liga da Justiça, começou a montar o chamado snyderverso, que seria o universo compartilhado da DC. Só que a coisa toda desandou e o próprio Snyder acabou dando um tempo após a morte de sua filha, mas, mesmo sem esta tragédia, é provável que ele teria saído de toda forma.

Mas o mundo dá voltas e o MCU, depois de ter chegado ao apogeu em Ultimato, começou a cair em qualidade, a chamada "fórmula Marvel" ficou desgastada e parece que até o Kevin Feige perdeu a energia, pois nada mais apareceu no cinema com o mesmo impacto de antes. 

Ainda é possível que a Marvel retome a grandeza que tinha até a fase 3, mas isto deve demorar alguns anos. Agora ela vive uma espécie de filler, o esfriamento da machine gun antes de voltar a metralhar.

Eis então que é o momento ideal para a DC assumir a frente neste mercado de blockbusters de super heróis. Coincidentemente, a Warner passa por uma nova direção, uma reformulação, somando forças com a Discovery + e ficando sobre a liderança de um empresário de grande visão estratégica e que não tem medo de tomar decisões visando o melhor desempenho da empresa. Sim, falamos do polêmico David Zaslav.

A visão de Zaslav para a DC é que se concentrem as energias (e o dinheiro) em produções fortes, de qualidade. A velha máxima de investir mais na qualidade do que na quantidade. Chega de fazer um monte de spin-offs genéricos. O negócio são os blockbusters.

Aí temos o Black Adam (2022), um filme que se alinha com esta visão de negócio do Zaslav e que também é uma boa oportunidade para um recomeço no DCU. O The Rock se mostra muito empolgado com este projeto, claramente disposto a se dedicar à construção de um universo cinematográfico pelos próximos anos. 

Já não é spoiler o fato de que uma sequência de Black Adam pode envolver um encontro e um confronto dele com o Superman. The Rock e Henry Cavill trocando sopapos na telona é garantia de sucesso. 

E para completar este alinhamento planetário que está se formando na DC, temos a novidade da criação da DC Studios, um departamento da Warner completamente dedicado à DC e tendo James Gunn e Peter Safran como copresidentes. Eles irão prestar contas diretamente com o chefão Zaslav e tudo o que for produzido de filmes, séries e animações da DC estará sob os olhares de ambos, especialmente de Gunn no aspecto criativo (Peter Safran se ocupará mais com o aspecto empresarial).

James Gunn já mostrou que ele se deu muito bem com a DC, tanto no remake de Suicide Squad, quanto na série spin-off Peacemaker. A DC sempre teve um ar mais sombrio, um conteúdo mais adulto que a Marvel, pois a Marvel pertence à Disney, uma empresa que sempre focou no público infantil e evitou coisas como violência explícita e humor negro. 

Na DC, James Gunn teve a liberdade criativa para manter a sua assinatura de diretor que flerta com o terror e o deboche politicamente incorreto. Agora ele terá o poder de orquestrar todo o novo DCU. Impossível não ver um futuro promissor para a DC para os próximos dez anos ou mais.

(26,10,2022)

Black Adam e a despedida do velho DCU

Black Adam (2022)

A primeira coisa que chama atenção em Black Adam (2022) é a presença do The Rock. Ele é naturalmente um cara de presença, tanto a presença física de 1,96 m, quanto o carisma. Ele já tem sua própria assinatura no cinema, de modo que sabemos o que esperar de um filme com a qualidade The Rock: a testosterona de um legítimo brucutu, cenas de ação, uma pitada de humor e sua atuação modesta que não impressiona, mas também não decepciona. Enfim, para quem procura um filme de ação bem Sessão da Tarde, o The Rock entrega este produto.

Não é diferente então com Black Adam. Só que tem outro detalhe: o filme foi dirigido por Jaume Collet-Serra, um cara que tem um histórico no gênero de terror, tendo no currículo obras como Orphan (2009) e um de meus favoritos do gênero, House of Wax (2005).

Por isso Black Adam acaba sendo o mais gore de todos os longas do DCU e provavelmente o que tem mais mortes. Os figurantes morrem como moscas, o que é propositalmente algo cômico e também uma forma de construir o protagonista, de mostrar que o Adão Negro não é um herói convencional, que ele trafega no limbo que separa um verdadeiro herói de um anti-herói. Definitivamente ele não é vilão, mas tem a indiferença ética de um vilão em termos de matar pessoas. 

Curiosamente, o filme conseguiu ter uma classificação PG-13, ou seja, não é recomendado para crianças, mas pré-adolescentes já podem assistir, apesar da violência. É uma violência bem maquiada com um ar caricato e meio cômico, como quando ele frita pessoas com seus raios, transformando-as em esqueletos carbonizados. Em uma cena ele arremessa um cara com tanta força que arranca o braço, mas realmente não parece um gore pesado. São cenas que fazem o público rir.

Pierce Brosnan; Black Adam (2022)
Coroa enxuto.

A parte técnica, os efeitos especiais, a caracterização dos personagens, as cenas de ação, tudo está satisfatório. Dá gosto ver as cenas de ação e o The Rock trocando sopapos com os heróis. A Sociedade da Justiça, que pela primeira vez aparece em um filme do DCU, está bem aparentada. Cyclone, Atom Smasher e o Hawkman têm uma aparência legal, mas o melhor de todos é o Dr. Fate, tanto em sua forma mística, que está bastante fiel aos quadrinhos, quanto na forma humana, encarnada pelo elegante sexagenário Pierce Brosnan. O véio já está pertinho dos 70 anos e continua um galã.

O vilão Sabbac é que acaba sendo meio desnecessário, aparecendo só para preencher o último ato numa luta rápida. Ele não tem nenhuma construção de identidade, de modo que pouco nos importamos com ele. De toda forma, ele proporciona mais uma cena de ação que é o que a gente espera desse tipo de filme.

E é isso. Black Adam é um filme de super-heróis nível Sessão da Tarde, no bom sentido. A famosa cena pós-crédito, que todos agora já sabem que se trata de um breve encontro dele com o Superman, é que plantou uma semente de expectativa quanto a uma continuação do velho DCU, com o retorno do Henry Cavill. Bom, provavelmente vai ser só um fan service mesmo, como foi o final do Snyder Cut em que vimos um universo alternativo em que o Jared Joker (o Coringa do Jared Leto) se alia ao que restou da Liga da Justiça para enfrentar Darkseid. Lembram disso?

Pois é, até o momento o DCU foi isso, muitas sementes plantadas, mas que não cresceram. O Snyder Cut deixou muitos ganchos para futuras histórias que nunca vão acontecer. Assim também deve ser com Black Adam e os outros filmes já lançados ou ainda por lançar, como o complicado The Flash (2023).

2023 deve ser o ano do encerramento definitivo deste DCU. Além de The Flash teremos mais um filme do Aquaman e do Shazam. Alguns projetos já foram cancelados, como a Batgirl, Wonder Woman 3, Man of Steel 2. A longeva série do The Flash termina em 2023, mais um passo para o fim do arrowverso.

A era James Gunn deve começar a partir de 2024 ou talvez em 2025, quando finalmente virá uma nova leva de filmes inaugurando um novo DCU. Sinceramente, acho que é a melhor coisa a ser feita e podiam já ter feito bem antes, desde o semi fracasso da Liga da Justiça (ok, não foi um fracasso, mas convenhamos que um filme da Liga merecia no mínimo fazer um bilhão e fez apenas 660 milhões).

Pela vontade do The Rock, que tanto repetiu que "a hierarquia de poder do DCU está prestes a mudar", Black Adam daria um novo rumo ao DCU, mas continuando o que já foi feito. Em vez disso, porém, Black Adam é mais um epílogo do velho DCU. 

Quero confiar no projeto do James Gunn que realmente parece interessado em planejar algo a longo prazo, para pelo menos uma década. Então que venha o novo DCU. 

(15,12,2022)

Habemus o novo DCU

Pois é, o James Gunn havia prometido revelar alguns planos para a DC em janeiro e ele esperou até o último dia para enfim soltar as novidades. E não foram poucas.

É inevitável a sensação de estranheza no fato de que agora a DC entrará num momento de transição e que teremos conteúdo ainda da velha fase, do snyderverso, à medida em que a nova fase vai se instalando. Mas lembremos que Man of Steel veio apenas um ano depois do final da trilogia do Batman de Nolan, prometendo recomeçar todo um novo universo de filmes. 

A série Smallville terminou em 2011 e no ano seguinte começou Arrow, construindo um mundo totalmente novo e sem relação com a timeline de Smallville. Ou seja, recomeços vão e vêm, ainda mais neste vasto multiverso de super-heróis. Nos quadrinhos a DC já passou por diversos reboots. 

É um curso natural do ciclo de vida destes shows. Em algum momento é preciso recomeçar. Os atores já envelheceram ou mesmo se cansaram do papel, o público está saturado ou não consegue acompanhar a abundância de material que já foi produzido. Chega o momento de voltar ao número zero.

A Marvel já passou do tempo de fazer isto. De fato, poderia ter aproveitado o grand finale de Vingadores Ultimato para se despedir de vez daquele universo e começar algo novo, focando nos X-Men, por exemplo. Eles ainda estão tentando extrair a última gota de suco daquela bilionária laranja, mas nos próximos anos personagens como Thor, Capitão América e Hulk devem no mínimo passar por um recast ou ficar fora de ação por um tempo. O Tony Stark já está aposentado, mesmo porque o cachê do Robert Downey Jr. acabou supervalorizando demais.

Voltemos, porém, à DC. Enquanto a Marvel conseguiu tamanho sucesso em sua franquia que foi capaz de manter a mesma timeline por 15 anos, a DC nunca engatou direito seu universo, fez uma bagunça até no filme da Liga da Justiça, nunca conseguiu fazer sequer uma trilogia do Superman ou um filme solo do Batman. A melhor saída só poderia ser uma: o reboot.

E foi pra isso que chamaram o James Gunn. A ideia é fazer o tal "plano de dez anos", desenvolvendo toda uma nova timeline do zero. A promessa é de que agora vai. E já temos alguns anúncios.

O grande feito do James Gunn até o momento foi a consagração dos Guardiões da Galáxia, um grupo totalmente desconhecido do grande público (e eu mesmo confesso que nunca li uma revistinha deles) e que foi um sucesso, virou parte da cultura pop. Hoje qualquer pessoa minimamente engajada na cultura pop reconhece a frase "I am Groot".

Depois ele investiu em outro personagem desconhecido, o Peacemaker, produzindo uma série de sucesso. Temos aí um padrão. James Gunn gosta de apostar em personagens desconhecidos. E agora ele planeja fazer isto no novo DCU.

The Authority

Entre os filmes anunciados, temos The Authority, um grupo que originalmente pertencia à Image Comics, do studio Wildstorm, fundado pelo Jim Lee, que depois foi adquirido pela DC. Tem a pegada sombria e realista que a DC gosta, de modo que será mais voltado ao público adulto.

O Swamp Thing vai ganhar mais uma chance. Ele já teve uma série que foi cancelada na primeira temporada lá em 2019 e agora volta em um filme obviamente de terror. Lembrando que lá na década de 80 ele teve dois filmes trash, em 1982 e 1989.

Supergirl: Woman of Tomorrow (2021-2022)

Supergirl: Woman of Tomorrow será um filme baseado em uma minissérie em quadrinhos bem recente, de 2021-2022, escrita por Tom King. Tem uma pegada de ficção científica, de modo que promete ser um longa bem encantador e com bastante CGI.

E agora chegamos aos medalhões, Batman e Superman. Não poderia faltar um anúncio a respeito deles, pois tudo o mais é um aperitivo. Convenhamos que já estamos saturados de filmes de origem do Batman, então foi uma escolha interessante começar com outro tipo de história. The Brave and the Bold terá como protagonistas o Batman e seu filho rebelde Damian.

Por fim, temos o maior de todos, o Superman, que terá uma nova origem em Superman: Legacy, com data já prevista para 11 de julho de 2025. O roteiro será do próprio James Gunn. É justo que o maestro de todo este novo universo se encarregue do personagem que estará no núcleo de tudo isso.

Curiosamente, no vídeo de anúncio do James Gunn, ao falar em Superman foi usada uma ilustração de All-Star Superman, série do Grant Morrison. The Brave and the Bold também faz referência à fase em que Morrison escreveu o Batman e até mesmo The Authority teve sua fase Morrison. 

Temos aí a fonte de inspiração do James Gunn? É possível que ele pretenda desenvolver um universo tendo como norte a visão fantástica e até psicodélica do Grant Morrison, o que será algo bem peculiar de se ver.

Sim, mas e quanto à Wonder Woman? Parece interessante dar um descanso à personagem que teve seu último filme em 2020, então em vez disso veremos uma série ambientada em Themyscira, chamada Paradise Lost. Parece que será uma espécie de Game of Thrones da DC, com uma estética medieval e provavelmente muita violência. Esta série deverá preparar o caminho para a vinda da futura Wonder Woman.

Haverá uma série animada, Creature Commandos, que será escrita pelo próprio James Gunn, e imagino que será o espaço onde ele poderá se divertir com ideias bizarras sem grandes preocupações, pois trata-se de um bizarro grupo de monstros liderados por ninguém menos que o Frankenstein.

Outra série será do Booster Gold, obviamente voltada para a comédia. Há rumores e torcida de fãs para que ele seja interpretado pelo Chris Pratt. É bem possível.

Hal Jordan and John Stewart

O que promete ser o novo arrowverso é Lanterns, sim, uma série dos Lanternas Verdes que trará nada menos que os dois mais memoráveis personagens desta corporação, Hal Jordan e John Stewart. Pela sua natureza, este programa tem potencial para se expandir, apresentar novos personagens, ramificar-se em spin-offs, enfim, se tornar de fato o novo arrowverso.

Uma série que causa estranheza neste grande anúncio é Waller, que terá como protagonista a Amanda Waller. Ou seja, mesmo que o show do Peacemaker tenha entrado em hibernação e talvez não volte mais, surge este spin-off com personagens daquele núcleo. Dá a entender que o reboot não será tão completo assim. Ao menos este pedaço do velho DCU, o gunnverso ou proto-gunnverso, parece que terá seu espacinho garantido.

Na verdade não seria difícil preservar alguns personagens do velho DCU, pois o filme do Flash está vindo aí e é a oportunidade perfeita para fazer um reboot que interligue os dois mundos. Em vez de simplesmente começar algo novo sem qualquer nexo com os filmes anteriores, como aconteceu na transição entre The Dark Knight Rises (2012) e Man of Steel (2013), agora é possível criar um link.

Pode ser que The Flash de fato realize  um flashpoint em que o personagem resetará a linha do tempo, abrindo o caminho para uma nova realidade e assim dando sentido para o fim do snyderverso. Neste processo de reset, alguns personagens podem extraordinariamente migrar para o novo mundo, como pode ser o caso da Amanda Waller. Bom, é esperar pra ver.

Além de The Flash, este ano também teremos Shazam 2 e Aquaman 2, que serão definitivamente os últimos da velha safra. O modesto filme do Blue Beetle parece ser um meio termo e não se sabe ao certo se será um resquício do snyderverso ou parte do novo gunnverso.

À parte de todo este imbróglio envolvendo a transição entre o velho e o novo DCU, existe o selo Elseworlds, que é como a DC costuma classificar suas histórias que se passam em universos independentes e sem conexão entre si. É o caso do Batman do Robert Pattinson, que terá sua continuação em 2025 e promete completar uma trilogia, e também o peculiar Coringa do Joaquin Phoenix, que voltará em 2024 com o título Joker: Folie à Deux.

Em 2013, durante a Comic Con, Zack Snyder apresentou um pedacinho, um misterioso e brevíssimo teaser de seu projeto para a DC. Surge o logo do Superman e a galera grita empolgada com uma possível sequência de Man of Steel. Não parou por aí, pois um segundo depois surge o logo do Batman envolvendo o do Superman. Logo caiu a ficha na nerdaiada que gritou numa empolgação há tempos não vista em um anúncio de filme da DC. Era o Batman v Superman.

Eu estava lá. Não na Comic Con, mas no Youtube vendo os vídeos vazados e minha empolgação não foi diferente. Eu estava vendo o nascimento do universo compartilhado da DC e acompanhei ano após ano este projeto ir por água abaixo.

Infelizmente o DCU não foi aquilo que a hype inicial nos fez esperar. Batman v Superman foi um filme decente, mas controverso. O fato é que não deu certo no sentido de construir um longo e bem sucedido universo da DC, não como a Marvel conseguiu.

Agora que o James Gunn prometeu novidades sobre seu plano para um novo DCU, acabei lembrando daquele momento lá de 2013, mas desta vez confesso que contive minha empolgação, pois agora tenho esta desconfiança de que a coisa pode não dar certo. De toda forma, eu quero acreditar e ainda enxergo o copo meio cheio. 

Acho que James Gunn tem potencial para orquestrar um universo de super-heróis bem melhor do que o Zack Snyder, então estou confiante. Eu torcia para um reboot já há alguns anos e eis que ele está acontecendo. É o certo a se fazer. Quero ver um novo Batman, um novo Superman e Wonder Woman. E finalmente teremos uma série dos Lanternas Verdes. Creio que já começamos bem. 

DCU roadmap

(31,01,2023)

Habemus The Flash

The Flash (2023)

Confesso que eu não botava muita fé no filme do Flash. O antigo DCEU já está nos seus últimos dias, o Ezra Miller se meteu em um monte de encrencas que na certa prejudicaram o marketing e havia um clima de velório do DCEU, séries se encerrando, alguns projetos bruscamente cancelados. The Flash conseguiria surpreender?

Pois eis que este primeiro trailer surpreendeu. Veio recheado de fan service, muita informação e mesmo assim parece que estão escondendo o ouro, que ainda há muito a entregar. O que ficou insinuado é que esse longa tem uma cara de Spider-Man: No Way Home (2021), uma grande aventura no multiverso, misturando personagens de várias timelines, uma salada de fan service.

Isto é bom? Levando em conta que esse será o filme de transição entre o velho DCEU e o novo DCU, é ótimo. The Flash parece prometer uma grande homenagem a toda a história da DC no cinema, não só ao snyderverso, mas a tudo o que veio antes. A prova disso é a aparição do Batman do Michael Keaton no trailer.

Pois é. Ele está lá. Aliás, o Michael Keaton parece que completará um ciclo na sua carreira com esta participação. É inegável que o que alavancou sua carreira como nunca foi o Batman dos anos 90. Foi ali que ele virou um superstar e ainda ganhou uma lambida da Michelle Pfeiffer.

Então os anos passaram e a carreira dele já não alcançou o pico de antes. Fez alguns bons filmes, mas nada de blockbusters. Seus dias de glória ficaram com o Batman. Pode-se dizer até que o Michael Keaton acabou criando um ressentimento com o Morcego e a indústria de filmes de super-heróis, uma vez que ele viu ao longo das décadas este gênero crescer e virar franquias bilionárias, canibalizando o entretenimento, enquanto ele ficou de fora disso tudo.

Em Birdman (2014) vemos uma espécie de satírico amargo desabafo do ator com relação a estas coisas. Depois da fase de glória e de abandono, ele agora estava na fase no ressentimento e amargura. Birdman foi um filme premiado, mas não chegou a consolar o ator com um Oscar.

Enfim veio a reconciliação, quando ele participou de Spider-Man: Homecoming (2017), agora como um vilão, o Abutre. Estava longe de ser um papel no nível do Batman, mas trouxe de volta o Michael Keaton ao mundo dos super-heróis, embora como vilão, antagonizando com o mocinho. Depois do Morcego e do Birdman, ele mais uma vez se torna um homem-pássaro na pele do Abutre (ok, morcego não é um pássaro, mas mantenho a analogia). 

Por fim, agora vem a completa redenção, a catarse, o reencontro com o personagem que o consagrou há mais de trinta anos, o Batman.

Este provavelmente é o mais importante fan service em The Flash (que só será superado se houver algum tipo de cameo do Superman do Christopher Reeve), mas The Flash é mais do que fan service, é um elo entre os mundos, o filme que criará um nexo entre todos os universos da DC, pavimentando bem o caminho para a era James Gunn.

Recentemente tivemos um Batman com a ênfase em seu aspecto detetive, o Batman noir de Robert Pattinson. Eis que agora o Michael Keaton parece que vem com um aspecto mais conhecido do personagem, o "Batman com preparo", aquele herói que sempre tem um plano pra tudo, sempre saca alguma carta da manga. No caso, a carta na manga será a Supergirl.

E quanto ao Flash? Então... voltamos ao problema do Ezra Miller. É evidente que ele virou a ovelha negra da família DC (e não sem razão), de modo que a pós-produção deste filme tentou tirar os holofotes dele, ainda que ele seja o personagem principal, direcionando ao Batman. Até no poster de divulgação vemos o Flash dentro da Batcaverna e a enorme capa do Batman acima dele.

A verdade é que, mesmo que o Ezra Miller fosse um santo, a presença do Batman em seu filme, ainda mais o primeiro grande Batman do cinema, inevitavelmente roubaria a cena. E não há problema nisso, aliás, a maneira como o Flash deve participar da trama é bem adequada a seu papel mitológico.

O chamado panteão da DC costuma ser associado aos deuses do Olimpo. Assim temos o Superman como Zeus, Aquaman como Poseidon, Wonder Woman como Atena, etc. Pois bem, o Flash é Mercúrio, o Hermes grego, aquele com asinhas nos pés. Hermes é o deus da comunicação entre os mundos, o mensageiro dos deuses, o elo entre o Céu e a Terra. Daí derivam palavras como "hermenêutica" e "hermético".

O Flash sempre teve este papel na mitologia da DC. Ele é quem viaja entre os mundos, os universos, iniciando ou terminando crises, fazendo mundos colidirem. Sua atuação é nas entrelinhas, enquanto a trama vai acontecendo com outros personagens que ganham mais destaque.

(13,02,2023)

The Flash e seu poder de completar ciclos

The Flash multiverse

The Flash vem aí e este filme tem um papel emblemático no curso da DC no cinema. Ele será a transição entre o snyderverso (ou DCEU, para aqueles que insistem que snyderverso consiste apenas nos filmes diretamente dirigidos pelo Snyder) e no gunnverso, o novo DCU.

As pessoas que já tiveram acesso exclusivo ao longa estão cheias de elogios, dizem que tem muito fan service, fan service do bom, e que de fato a transição entre os universos convence. Mesmo quem ainda não viu pode notar mais um detalhe com base nos trailers: o Batman do Michael Keaton vai roubar a cena.

É um recurso narrativo comum em filmes colocar um personagem que espelha o próprio público. Ou seja, as reações dele ao que está acontecendo são bem semelhantes às nossas enquanto assistimos ao filme, de modo que este personagem nos transporta para dentro daquele mundo, contribuindo para a imersão. Ele é uma espécie de "espectador interno".

Na franquia Matrix, por exemplo, temos o personagem Link. Ele fica boa parte do tempo diante de telas de computador, assistindo a ação dos seus colegas dentro do mundo virtual. Enquanto observa o que está acontecendo na Matrix, ele vai fazendo um "react", fica intrigado com eventos estranhos, ansioso com um momento de suspense e a cena que melhor exemplifica seu papel como espelho do público é quando Neo aparece voando, literalmente como um Deus ex machina, e salva Morfeu e o Chaveiro de uma explosão. Neste momento o Link, que via a cena em seu computador, comemora eufórico, espelhando a reação do próprio público no cinema.

No caso de The Flash, os trailers mostram uma cena em que o Bat-Keaton vai saltar do jato e recomenda que os dois Flashes usem paraquedas. Um deles, admirado, pergunta ao Batman onde está o paraquedas dele, mas o Morcego simplesmente salta livremente porque, convenhamos, o Batman não precisa de paraquedas. Vendo esta performance badass, o Flash grita eufórico como que pensando: "Esse cara é tão cool!"

Esta breve cena mostra que o Batman será o objeto de admiração do espectador interno, no caso uma das versões do Flash. Inclusive em outras cenas este Flash também fica tietando a Supergirl, o Batmóvel e o próprio Flash.

Assim teremos um Flash protagonista e outro mais voltado ao alívio cômico e a representar o espectador. Não há dúvidas, porém, que a presença mais marcante será a do Batman, mais especificamente, o Batman do Michael Keaton. Seu retorno ao papel também é emblemático, é o fechamento de um ciclo de décadas de produção cinematográfica da DC e também o fechamento de um ciclo da própria carreira do Michael Keaton.

Depois do Superman do Christopher Reeve, foi o Batman do Michael Keaton que mostrou o potencial das adaptações de quadrinhos no cinema, pavimentando o caminho para uma gigantesca indústria. Tudo o que veio depois, os X-Men, o Homem Aranha e o MCU, veio trilhando este caminho inaugurado lá no final da década de 80. 

The Flash, portanto, fará uma grande homenagem a toda esta longa história cinematográfica, trazendo o passado de volta ao mesmo tempo em que abre a porta para o próximo projeto de dez anos. 

O Flash carrega em sua essência esta habilidade de completar ciclos. A supervelocidade o faz correr em círculos. Ele é um arquétipo de Mercúrio, o deus mensageiro, que cria uma comunicação entre os mundos celestial e terreno. Ele viaja no tempo, ligando passado e futuro. Nada mais apropriado, portanto, do que ele ser o personagem que realizará esta transição de universos da DC no cinema, como já fez também nos quadrinhos.

(02,05,2023)

Habemus Superman e Lois

Rachel Brosnahan and David Corenswet

Aos poucos o DCU está renascendo, recomeçando. A primeira grande notícia a respeito foi o anúncio do James Gunn como o líder do novo DCU, depois veio o importante anúncio do filme do Superman em 2025. Hoje tivemos o terceiro grande anúncio que vai pavimentando este novo universo e alimentando a hype dos fãs: o ator foi escolhido.

Mais ainda, foi escolhida a dupla que interpretará Clark Kent e Lois Lane: David Corenswet e Rachel Brosnahan. A reação da galera na internet tem sido positiva. São dois atores queridos, que não se metem em polêmicas, bem diferente de um Ezra Miller da vida.

É o que a DC está precisando agora, um recomeço pacífico, com atores que tragam este ar de renovação. É curiosa a semelhança física entre o David Corenswet e o Henry Cavill, o que pode ajudar na aceitação do novo Superman que será uma versão mais jovem da versão do Henry Cavill.

Vida longa ao novo DCU!

(27,06,2023)

Réquiem para o antigo DCU

Justice League

2023 foi o final do chamado antigo DCU (também conhecido como DCEU ou snyderverso), um universo cinematográfico que começou exatamente há 10 anos, em 2013 com o Man of Steel.

Zack Snyder começou sua jornada na DC com Watchmen (2009), na mesma época em que Christopher Nolan estava trabalhando na trilogia do Batman. Do lado da Marvel, o MCU estava no comecinho, a partir do primeiro Iron Man (2008) e, quando veio o grande sucesso de The Avengers (2012), a DC se deu conta de que precisava urgentemente começar seu próprio universo cinematográfico.

Alguém precisava liderar este universo. O Nolan era uma opção, já que ele fez um enorme sucesso com o Batman, mas convenhamos que não seria do interesse dele se comprometer a tocar um projeto de dez anos ou mais só voltado a super heróis. Nolan passou o bastão para Snyder.

Só que sejamos sinceros, por mais nerd de quadrinhos que seja o Snyder, ele também não estava muito a fim de ser o Kevin Feige da DC. Snyder queria fazer seus filmes, quem sabe fechar uma trilogia da Liga da Justiça, e partir para novos projetos. Não estava na agenda dele coordenar todo um universo de personagens.

Ele até tentou apresentar o máximo de personagens possíveis para ir costurando um universo, o que fez de forma meio caótica em Batman v Superman (2016), apresentando às pressas os membros da Liga que logo em seguida se reuniriam no primeiro e único filme da Liga da Justiça (2017).

Desta forma, o snyderverso tentou ser tudo em todo lugar ao mesmo tempo. O Superman, que devia ter uma trilogia, em vez disto teve uma trilogia indireta (Man of Steel, Batman v Superman e Justice League). O Batman nem mesmo teve um primeiro filme solo. Ele já começou com um crossover com Superman e Wonder Woman. 

Batman v Superman foi uma grande mistureba tentando conectar todas as pontas do novo universo. Por um lado foi um filme do Batman, mas também um filme da morte do Superman e uma prequel da Liga da Justiça. Já era um sinal que o DCU não estava se desenvolvendo no ritmo certo.

Para bagunçar ainda mais, eis que o Justice League passou por uma segunda edição na mão de Joss Whedon, alegadamente devido ao fato do Zack Snyder estar passando por uma tragédia pessoal com a perda da filha, mas a verdade é que os executivos da Warner queriam marvelizar o filme, aí chamaram o Whedon pra dar uma amenizada no tom sombrio do Snyder. O resultado foi um Frankenstein meio Snyder meio Whedon.

O Zack Snyder já tinha estabelecido uma base de fãs, e uma base bem barulhenta, pois os snydetes se movimentaram tanto nas redes sociais que a Warner deu carta branca para Snyder produzir uma edição totalmente autoral, um Snyder cut da Liga da Justiça, filme este que veio em 2021 com nada menos que quatro horas de duração.

O Snyder cut ao menos serviu como redenção e despedida do Zack Snyder, mas também como o canto do cisne do snyderverso. A esta altura já estava claro que o DCU precisava de um recomeço.

James Gunn and The Suicide Squad cast

Eis que surge o James Gunn. Ele chegou de mansinho com um belo e divertido reboot de Suicide Squad (2021) que resultou na série do Peacemaker (2022) e acabou ganhando o cargo de CEO da DC Studios. Sua missão era ser o maestro de um novo DCU. Além disso, ele ficou encarregado de começar este novo universo dirigindo nada menos que um primeiro filme do Superman, a ser lançado em 2025.

2022 e 2023 então foram um longo velório, um limbo, uma despedida do antigo DCU que lançou os filmes que já estavam produzidos e até cancelou um que já estava praticamente pronto, mas parecia tão ruim que nem valia a pena lançar: Batgirl. O fim prematuro da Batgirl foi como a amputação de um membro em um paciente já terminal.

Bom lembrar que, além do James Gunn, teve outra força que se levantou tentando recriar o universo da DC: o The Rock. Ele chegou como quem não quer nada, encarnando o Black Adam (2022), mas parecia ter a intenção de assumir o DCU a partir dali, criar seu próprio "rockverso". Ele até criou um slogan de sua campanha: "A hierarquia de poder do DCEU está prestes a mudar".

E mudou mesmo, mas não como o The Rock esperava. Black Adam foi mais uma peça na despedida do velho DCU, um tripulante que afundou junto daquele navio. Além disso, o novo chefão da Warner, David Zaslav, já bateu o martelo: James Gunn seria o cabeça da DC.

David Zaslav

Em 2023 o clima de despedida prosseguiu. O Shazam teve seu segundo e último filme, o Besouro Azul teve seu primeiro, único e desimportante filme (apesar das promessas de que ele permanecerá no novo universo, acho bem improvável que ele retorne), o Flash teve seu primeiro e também último filme.

Eu diria até que é emblemático que o filme do Flash tenha vindo já no finalzinho do velho DCU, uma vez que simbolicamente ele é um personagem de transições, de fim e recomeço, como um Hermes a transitar entre mundos e realidades. 

O filme dele teve seus momentos divertidos, além de ter servido também como uma valiosa redenção do Michael Keaton, que guardava certa mágoa do gênero de super heróis desde que perdeu o papel de Batman, mágoa esta que ele externou em Birdman (2014), mas isso é outra história. O importante é que o retorno do velho Batman do Michael Keaton foi a melhor coisa nesse filme do Flash. Um retorno e uma despedida... ou não, já que uma vez que o Flash apresentou o multiverso, está aberta a porta para futuros crossovers.

Por fim, para apagar a luz e fechar a porta do velho DCU, temos Aquaman 2 (2023).

O primeiro filme do Aquaman (2018) foi um caso bem peculiar. Foi o maior sucesso de todo o DCU, ultrapassando uma bilheteria de 1 bilhão. E não precisou fazer nada de especial para ser um bom filme. Não tem nenhuma assinatura marcante de diretor, como os longas do Snyder, nenhuma história mirabolante, mas ainda assim conseguiu atingir certo nível épico, apresentando um rico e variegado mundo submarino, muito bem desenvolvido com um CGI decente. De bônus, temos o carisma do Jason Momoa e a perpétua beleza da Nicole Kidman.

Aquaman 2, lançado cinco anos depois, conseguiu ser tão bom quanto o primeiro, adotando um tom ainda mais voltado à aventura, bem estilo anos 90 (eu diria até com algumas cenas meio Indiana Jones em selvas e cavernas). O CGI continuou muito bom, bem melhor que do filme do Flash, aliás, enchendo nossos olhos com toda uma vida submarina, com criaturas e máquinas atlantes.

Este filme não se leva a sério, não tenta agarrar-se à possibilidade de uma sobrevida, como o Black Adam tentou. No final, o Momoa até mesmo quebra a quarta parede e se despede do público com um grito em tom zoeiro. Momoa saiu de boa, despediu-se do papel sem lamentos, afinal ele sabe que algo empolgante o espera no novo DCU: o Lobo.

Arrowverse cast

Em sincronia com o fim do DCU, também temos o fim do arrowverso, um universo que começou no finalzinho de 2012 e seguiu por uma década ramificando-se numa enormidade de séries. O arrowverso realizou uma proeza que o DCU não conseguiu, ele de fato desenvolveu um rico e interligado mundo com diversos personagens e tramas que se interconectavam em grandes crossovers. 

O arrowverso fez sua parte, fez história no mundo nerd e sempre será lembrado, mas estava na hora de terminar. Seu encerramento em sincronia com o DCU abre espaço para a construção de um mundo totalmente novo e no qual haverá uma interligação planejada entre filmes e séries.

Que venha o novo DCU!

(02,03,2024)

Palavras-chave:

Alberto de Oliveira, Andy Forssell, Andy Muschietti, Ann Sarnoff, Christopher Nolan, Christopher Reeve, David Corenswet, David Zaslav, DC Comics, Ezra Miller, Gal Gadot, Geoff Johns, Grant Morrison, Henry Cavill, James Gunn, Jared Leto, Jason Kilar, Jason Momoa, Jaume Collet-Serra, Jim Lee, Joaquin Phoenix, Joss Whedon, Kevin Feige, Michael Keaton, Nicole Kidman, Peter Safran, Pierce Brosnan, Rachel Brosnahan, Robert Pattinson, The Rock, Tom King, Warner, Zack Snyder

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