Neollogia
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John Wick, um resumão da franquia

John Wick, a renascença dos filmes de ação

John Wick (2014)

John Wick é um assassino da máfia russa aposentado que escolhe ter uma vida normal depois de se apaixonar por Helen, mas ela adoece e acaba morrendo, deixando como lembrança um cachorrinho beagle que por um momento se torna o companheiro de John em seu luto, até que um filho do chefão da máfia, por puro capricho e sem saber quem era John, mata o seu cão e rouba o seu carro, um Mustang 69.

Pronto, agora ninguém vai parar o instinto assassino de John Wick que vai revirar o mundo da máfia e matar quem estiver no caminho a fim de se vingar. Não mate o cachorrinho de John Wick! Você vai se dar mal…

O diretor do filme, Chad Stahelski, tem uma grande carreira em filmes de ação. A princípio foi professor de artes marciais, até que começou a atuar como dublê em filmes. Foi ele o dublê de Brandon Lee nas cenas de ação de O Corvo (1994) e chegou ao auge como dublê de Keanu Reeves em Matrix (1999), de modo que passou também a coordenar as lutas nos filmes seguintes da trilogia.

Keanu Reeves; John Wick (2014)

Entre outros filmes em que participou como dublê ou coordenando as cenas de ação e luta, temos Spiderman 2 (2004), Sr. & Sra. Smith (2005), V for Vendetta (2005), 300 (2006), Duro de Matar 4.0 (2007), Rambo (2008), X-Men Origins: Wolverine (2009), Iron Man 2 (2010), Faster (2010), Killer Elite (2011), The Expendables (2010) e The Expendables 2 (2012), Safe (2012), The Hunger Games (2012) e The Hunger Games: Catching Fire (2013), The Wolverine (2013), After Earth (2013)... Ufa!

Stahelski é, portanto, o queridinho dos filmes de ação, tiroteio e pancadaria de Hollywood. Trabalhou com Jason Statham, Stallone, De Niro, Jet Li, Dolph Lundgren, Chuck Norris, Dwayne Johnson, Van Damme, Bruce Willis, Terry Crews, Arnold Schwarzenegger... Mas a sua grande parceria, sua alma gêmea, é o Keanu Reeves, de quem foi dublê e coreógrafo na franquia Matrix, Constantine (2005) e Man of Tai Chi (2013). Foi o próprio Reeves quem indicou Stahelski para dirigir o novo filme.

Mas peraí. Pra que falar aqui do currículo inteiro desse cara? Bom, John Wick pode ser considerado uma nova fase na carreira de Stahelski, pois agora ele não é mais dublê nem coreógrafo, mas o responsável por toda a direção. É um avanço em sua carreira e, como diretor, manteve a sua especialidade, gravando boas cenas de tiro, porrada e bomba, com elegância, sem exageros e mostrando também que o Keanu Reeves ainda está em boa forma para filmes de ação.

Keanu Reeves; John Wick (2014)

Na verdade, ele praticamente não precisou de dublê, pois o próprio Reeves disse que realizou a maioria das cenas de ação. Além de distribuir socos, seu personagem tem habilidade com armas de fogo (óbvio) e seu estilo de luta possui elementos de judô, uma arte marcial pouco usada neste tipo de filme (geralmente as lutas mortais no cinema envolvem kickboxing, kung fu, jiu jitsu, karatê...). Total de mortos: 78 (segundo o IMDb).

O elenco tem uma feliz combinação de rostos conhecidos no mundo nerd: Laurence Fishburne (o eterno Morfeu de Matrix), Willem Dafoe, Alfie Allen (o sofrido Theon Greyjoy de Game of Thrones), Adrianne Palicki (a Harpia em Agents of S.H.I.E.L.D.) e Bridget Regan (a Dottie Underwood em Agent Carter).

A princípio John Wick teve um sucesso razoável para uma produção de baixo orçamento, mas se tornou instantaneamente um ícone cult e parte integrante da cultura nerd dos personagens badasses, bons de briga e mestres de armas. É uma mistura dos soldados brucutus armados até os dentes dos filmes dos anos 90 e artistas marciais dos filmes asiáticos.

A fórmula mágica de John Wick é essa: um diretor com uma imensa bagagem na arte das cenas de ação, luta e coreografia; Keanu Reeves, um ator com carisma e ao mesmo tempo habilidade física para encarnar o papel; e por fim um roteiro que consegue desenvolver a lenda de um personagem e seu mundo. 

Keanu Reeves; John Wick (2014)

Ao longo dos filmes (até o momento foram lançados 3 filmes: em 2014, 2017 e 2019 e já está previsto mais um em 2021), tanto o drama pessoal de John é desenvolvido, quanto o seu universo fictício em que há todo um submundo da máfia escondido por baixo do véu da sociedade. No mundo de John Wick você pode se deparar com um assassino profissional em cada esquina. Pode ser um mendigo na calçada ou o senhor da banca de jornal. É como os aliens em Men in Black.

A máfia é elegante, cheia de regras internas e tem até sua moeda própria (que é bem confusa, já que uma moeda pode ser usada tanto para pagar um drinque quanto para comprar um carro) e seus departamentos como hotéis e lojas de armas super chiques e estilosas.

O que a princípio era uma vingança pessoal do John Wick, vai escalonando para uma situação de um homem contra toda a sociedade de assassinos e é aí que John Wick se torna uma espécie de novo Chuck Norris, um cara absurdamente invencível. Na cultura nerd John Wick já se tornou esse sinônimo de assassino imparável e que é a pura mistura do charme com a periculosidade. Além disso, ele tem uma nobre e fofa motivação: é o melhor vingador que um cachorrinho morto pode ter.

(01,08,2019)

A estética multicolorida de John Wick

Keanu Reeves; John Wick Chapter 2 (2017)

No geral, os filmes do John Wick não são muito diferentes de qualquer outro do gênero de máfia e ação, mas essa franquia tem alguns ingredientes especiais que tornam a fórmula mais peculiar e interessante.

Pra começar, temos, é claro, a presença do Keanu Reeves, com seu charme mágico e sua verdadeira habilidade em atuar como um ator-dublê, participando intensamente de muitas das cenas de luta, tiro e ação, até mesmo dispensando a ajuda de dublês. Seu desempenho é verdadeiro e natural, de modo que não precisa de muitos malabarismos na direção e truques de corte ou CGI.

Ok, ele pode não ser um grande ator nas nuances das expressões faciais e tal, pois ele tem basicamente só uma expressão, mas em termos da chamada "fisicalidade", ele entrega bastante. Poucos atores dominam esta arte das coreografias de luta e ação e preferem deixar nas mãos de dubles. Já o Keanu Reeves põe a mão na massa quando se trata de cenas de ação.

John Wick Chapter 2 (2017)

Outro elemento de grande importância é o diretor Chad Stahelski que possui uma vastíssima carreira na área de stunt, o trabalho dos dublês, inclusive ele próprio foi dublê do Neo em Matrix lá em 1999 e ao longo dos anos se aprimorou bastante nessa área.

Temos o roteiro que conseguiu criar um personagem mítico e um mundo de fantasia em que a máfia é uma verdadeira sociedade paralela em Nova York e mesmo no mundo. Bom, não que na vida real não seja mais ou menos assim, só que em John Wick existe toda uma cultura da máfia, códigos, até moeda própria, hotéis próprios (os continentals), uma organização que coordena os mendigos de rua e outros párias da sociedade, que funcionam como espiões e se comunicam usando pombos (digamos, uma internet ornitológica).

Por fim, temos a estética. Hoje em dia se tornou uma moda os filmes de ação usarem filtros sombrios e cores nubladas, acinzentadas ou azuladas, criando um mundo monocromático e frio. O primeiro John Wick (2014) até começou assim, mas teve alguns momentos mais coloridos, principalmente nos bares noturnos som seus neons verdes e vermelhos.

John Wick: Chapter 3 - Parabellum

O segundo filme (2017) flerta ocasionalmente com tons lilases, desenvolvendo esse ar que se pode chamar de neon noir, mas é no terceiro filme (2019) que as cores se soltam. Não só as cores, mas também os cenários. 

As primeiras duas sequências se passam em ambientes convencionais para filmes de máfia: ora nas ruas, ora em hotéis e bares ou até túneis secretos nestes locais. Já o terceiro longa é bem diversificado. Wick num momento está em Nova York, noutro está em Marrocos, ora nas iluminadas ruas noturnas da cidade, correndo sob a chuva, ora vagando no deserto. Tons de azul, verde, vermelho, lilás e amarelo se alternam nestes cenários.

John Wick: Chapter 3 - Parabellum

John Wick: Chapter 3 - Parabellum

Também o combate no terceiro filme se torna muito mais versátil. Vemos John Wick dispondo de uma variedade imensa de armas de fogo, além de facas (tem uma cena em uma loja de armas brancas em que ele arremessa algumas dezenas de facas e até um machado), espadas, e rola até mesmo uma luta em uma biblioteca e claro que ele espanca e mata um cara com um livro. Nada mais digno de quem já matou gente com um lápis.

Esse é o segredo do John Wick, ele é o MacGyver do combate, se virando com o que estiver à disposição. Na distribuição de suas skills, é praticamente bom em tudo: tem uma excelente mira de curta e longa distância, com alta taxa de headshots, sabe lutar com socos e chutes, bem como usar wrestling para derrubar ou imobilizar, domina armas brancas e ainda é bom piloto de carros, motos e sabe cavalgar como um profissional do hipismo.

John Wick 3 (2019), The Good, the Bad and the Ugly (1966)

A cena em que ele entra em uma loja de armas antigas e começa a montar o seu revólver customizado, misturando peças de uma e outra arma, é uma interessante homenagem ao clássico The Good, the Bad and the Ugly (1966), quando Tuco entra em uma loja e faz exatamente o mesmo, montando sua própria arma. Um exemplo do espírito MacGyveriano do personagem.

John Wické um caleidoscópio de habilidades e é justo que seu mundo seja retratado com uma rica paleta de cores.

John Wick: Chapter 3 - Parabellum

(24,12,2019)

A ética dos assassinos em John Wick 4

John Wick: Chapter 4 (2023)

Além, obviamente, da presença marcante de Keanu Reeves e da direção rica em ação e efeitos práticos do Chad Stahelski, a franquia John Wick se destaca pelo "universo dos assassinos" que foi criado, um submundo com suas próprias regras, economia, rituais e até um código de ética.

Em John Wick 4 (2023), este código de ética ficou ainda mais evidente e em diversas situações vemos que mesmo o mais psicopata dos assassinos segue certos princípios, como uma espécie de bushidô da máfia. Eles não matam por matar, especialmente outros assassinos. Há um respeito mútuo e a arte do assassinato segue regras como um jogo. 

De fato, este submundo dos assassinos em John Wick se mostra com a fineza da civilidade que a distingue da barbárie. O terno, usado praticamente como um uniforme, mas também como uma armadura (literalmente uma armadura, já que é revestido com kevlar), é um símbolo desta civilidade. Eles não são apenas matadores de aluguel, são "gentlemen", cavalheiros que têm ética e etiqueta.

Um bom exemplo disto é o personagem Caine (interpretado por Donnie Yen, mundialmente conhecido pelo papel do mestre Ip Man), um assassino aposentado que tem impressionantes habilidades, mesmo sendo cego. Ele é recrutado pela Alta Cúpula para caçar John Wick, mas encontra em seu caminho um amigo de Wick, Shimazu Koji.

Na cena em que Caine mata Koji, vemos uma amostra da ética dos assassinos e até mesmo de uma espécie de misericórdia e aceitação das consequências. A filha de Koji insinua atacar Caine para se vingar, mas ele simplesmente diz: "Viva". Ou seja, ele está dizendo que pretende poupá-la, deixando-a viva para sepultar o pai, então aconselha que ela não se precipite em atacá-lo. E vai além, pois também diz que esperará por ela, assim reconhecendo o direito que ela tem de se vingar. É a consequência natural dele ter matado o pai dela.

Caine é um velho amigo de John Wick, mas a Alta Cúpula o obriga a cumprir a missão, ameaçando matar sua filha. Ao longo do filme, Caine e Wick ora estão se enfrentando, ora estão civilizadamente conversando. Em certo momento ambos se encontram no interior de uma igreja, tendo uma conversa amistosa, mesmo sabendo que logo depois devem se enfrentar em um duelo mortal. 

Outro caso curioso é o do Tracker (Rastreador), um assassino de nome desconhecido que é pura e simplesmente um caçador de recompensa. Como John Wick está com a cabeça a prêmio, o Tracker vai atrás dele e, assim como Caine, eles cruzam caminhos várias vezes, mas como sempre Wick consegue escapar. 

O Tracker se mostra um homem obstinado em seu objetivo. Ele quer a grana e para ele esta caçada não é nada pessoal, é puro negócio, uma oportunidade de ouro para fazer seu pé de meia. Só que acontece algo. Em meio a um embate, um dos enviados da Cúpula chega perto de matar o cachorro do Tracker e isto no exato momento em que Wick e o Tracker estão cara a cara. Em vez de aproveitar a chance que teve para matar o Tracker, John Wick atira no capanga, assim salvando o cachorro. 

Naquele momento, a coisa se tornou pessoal para o Tracker. Ele reconheceu a honradez de John Wick, um assassino frio como todos os outros, mas capaz de apiedar-se de um cachorro, mesmo arriscando a própria vida para salvá-lo. Foi este gesto que convenceu o Tracker a desistir da recompensa. Ele renunciou a quase cinquenta milhões de dólares em uma atitude de gratidão.

Assassinos com honra e que jogam conforme as regras do jogo. No final, as intrincadas regras desta sociedade permitem que John Wick resolva de vez sua dívida com a Cúpula em um duelo de cavalheiros, bem no clássico estilo de duelo de pistolas.

Todo este código de conduta, os ternos, as tradições da sociedade dos assassinos, a maneira ritualística com que resolvem suas desavenças, serve como uma forma de distinguir a barbárie da civilização. Certos problemas humanos perduram mesmo em uma sociedade civilizada, o conflito de interesses, a luta armada. 

O que distingue a barbárie da civilização é o método, a existência de regras, mesmo ao matar. Pode não ser uma maneira de resolver completamente o problema da violência na sociedade, mas é uma forma de amenizá-lo, evitando que mesmo assassinos se tornem meras bestas animalescas que matam indiscriminadamente. 

Keanu Reeves; John Wick: Chapter 4 (2023)
A presença da igreja, assim como do hotel, representa a ordem civilizada em meio ao caos violento da sociedade dos assassinos.

(06,02,2024)

The Continental, as origens do hotel da franquia John Wick

The Continental, From the World of John Wick (2023)

John Wick, desde o primeiro filme, já se tornou um fenômeno pop e pode-se até mesmo dizer que ele deu início à renascença do gênero de ação.

A franquia se tornou bastante produtiva. Um filme que vira trilogia é certamente um sinal de sucesso. Se ele vai além da trilogia, então o sucesso está mais do que consolidado. Até o momento John Wick já possui uma quadrilogia e um filme spin-off, Ballerina, está previsto para 2025.

Além dos filmes, tivemos também uma minissérie, The Continental (2023), focada no personagem Winston Scott (Colin Woodell). A série tem apenas 3 episódios, mas cada qual contando com uma hora e meia de duração, o equivalente, portanto, a uma temporada de 6 episódios de 45 minutos.

A trama se passa na década de 70 e mostra como Winston se tornou o gerente do hotel Continental, um braço em Nova York de uma vasta rede internacional. Na época, quem gerenciava o hotel era o egocêntrico Cormac (muito bem interpretado pelo Mel Gibson), que já contava com a presença do fiel mordomo Charon (interpretado em sua versão jovem pelo Ayomide Adegun).

Já nos primeiros 10 minutos a série mostra a que veio, com uma excelente cena de ação. Teremos muitas outras cenas no mesmo nível, fazendo jus a um produto da franquia John Wick. 

A série tem elementos de heist movie, o que inclui a presença de personagens bem peculiares, cada qual com seu jeitão. Um dos mais legais é o Jenkins (Ray McKinnon), um sniper muito tranquilo e amistoso. Ele invade um apartamento ao lado do hotel para ficar matando a bandidagem pela janela, mas a dona da casa aparece, uma indefesa senhorinha. Ele com muita cautela faz ela de refém e continua seu trabalho de sniper enquanto amistosamente conversa com ela.

Mark Musashi, Marina Mazepa; The Continental, From the World of John Wick (2023)

Bem diferente do Jenkins, temos os gêmeos, chamados de Hansel e Gretel (Mark Musashi, Marina Mazepa). Eles têm um jeito bem esquisito, o olhar fixo, gestos sincronizados e parecem ser os mais habilidosos em todo aquele mundo do crime. Seria interessante ver o John Wick lutando contra estes dois, o que não será possível porque eles acabam morrendo.

(16,04,2024)

Palavras-chave:

Adrianne Palicki, Alfie Allen, Bridget Regan, Chad Stahelski, Colin Woodell, Donnie Yen, Euby Rose, Greg Coolidge, Ian McShane, Keanu Reeves, Lance Reddick, Laurence Fishburne, Lionsgate, Marina Mazepa, Mark Musashi, Mel Gibson, Peacock, Ray McKinnon, Willem Dafoe

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